Best of 2015
Habemus best of! Fumo branco na redacção do Meia de Rock ao fim de vinte e quatro dias de árduas negociações. Não foi fácil chegar a um consenso, mas aqui está ele: o mais ponderado best-of do ano, sem nacionalidades predilectas, sem discriminações nem segregações, só com a música em mente.
O mundo da música está mudado. As tecnologias permitem que com um computador e pouco mais se possa gravar ou até produzir música. Muito se produz, muito se publica nas mais variadas plataformas e claro, muito se perde pelo caminho. Ironicamente, o que há de inclusivo nas novas tecnologias, torna muitas vezes a melhor das músicas escondida, imersa como uma gota de água no meio do oceano. De tudo o que nos chegou, daquilo que conseguimos alcançar, dez álbuns foram escolhidos como os melhores de 2015, sem nenhuma ordem em particular.
“Hairless Toys” | Róisín Murphy
Sublime, enigmático, soberbo . A chegada do terceiro e tão aguardado álbum a solo de Róisín Murphy, depois do poderosíssimo “Overpowerd “em 2007, surpreendeu tudo e todos e não podia ter vindo em melhor altura. A rainha do electro-pop cresceu e tornou-se uma mulher misteriosa, o electro-pop ajustou-se e o ‘women power’ de “Overpowerd” deu lugar a uma distinta maturidade musical, a uma subtileza transcendente. Mas Róisín continua a ser Róisín, e Róisín só há uma… “Hairless Toys” continua a ter toda a sua extravagância, toda a sua exuberância, mas menos evidente, escondida por de trás de uma electrónica quase experimental, cordas bem marcadas e teclas genialmente colocadas.
“Elsewhere” | Moullinex
“Elsewhere” veio provar que Moullinex é um verdadeiro mágico, muito para além das batidas e sons altamente dançáveis que produz. Na pista de dança as batidas são mais que bem-vindas, mas para o estúdio Luís Clara Gomes traz muito, muito mais. Traz influências mil e um álbum digno de figurar em lugar de destaque na biblioteca de qualquer amante de música. O disco é uma espécie de livro aberto para as infinitas possibilidades criativas da mente de Luís. Desde um Moullinex mais clássico e pronto para dar um pezinho de dança em “Don’t you Feel” até a um Moullinex mais explorador no mundo das sonoridades psicadélicas de “Widening Circle”, passando até por um Moullinex mais melancólico em “Lies – Pt.2”, no segundo longa-duração do músico lisboeta vale tudo. Mas há coisas que nunca mudam, aquele toque tão característico, aquela disco que é toda Moullinex está lá, bem presente e sempre pronta a catapultar-nos para a pista de dança. Num equilíbrio perfeito, apenas possível nas mãos certas, “Elsewhere” grita a velha disco ao mesmo tempo que nos sussurra a contemporaneidade.
“Mar Aberto” | Medeiros/Lucas
Um dos mais distintos projectos açorianos de sempre, onde a tradição e a inovação dão as mãos e elevam a música tradicional açoriana a um nível nunca antes visto. Medeiros/Lucas são isso mesmo, uma viagem entre o ontem e o hoje, um mar de insularidade, um navio que zarpa sem destino à vista. “Mar Aberto” é o álbum de estreia do projecto que junta a profundidade da voz de Carlos Medeiros à modernidade de Pedro Lucas, mas não é só um conjunto de músicas. “Mar Aberto” é mais que uma boa execução e uma voz marcada e com carácter, “Mar Aberto” é sentimento, é saudade, é açorianidade – é o espelho da gente que tem no Mar o limite para o infinito.
“Atlas” | Branko
De Amsterdão para São Paulo. Daí à Cidade do Cabo é um pulinho. Passamos a Nova Iorque e acabamos em casa, em Lisboa. Parece ser o roteiro de umas férias de sonho, mas não – é simplesmente a rota de Branko na produção de “Atlas”, o seu álbum de estreia a solo. Talvez por isso este não seja só mais um álbum – aqui há diversidade, interacção cultural. As influências vão desde o house de África do Sul até ao funk brasileiro, passando pelo bubbling de Amsterdão e conseguem até ao hip hop norte-americano. À primeira vista parece qualquer coisa como uma mistura imiscível, mas estamos a falar de Branko, o homem que consegue juntar crioulo e inglês, espalhados por mais de vinte artistas convidados, no mesmo álbum. O resultado final? Aquilo que por vezes há em deficiência no mundo da música contemporânea – algo verdadeiramente inovador.
“In Colour” | Jamie XX
“Oh My Gosh!”. A primeira frase que ouvimos, a primeira ideia que nos vem à cabeça e torna-se praticamente impossível dizer algo mais – Oh meu Deus! Muito mais que música, um veículo de emoções, uma hora de pura magia… Mas agora descendo um pouco à Terra, “In Colour” é o álbum de estreia de Jamie XX, o homem por de trás dos The XX. Batida bem marcada, linhas de piano sublimes, pormenores deliciosos e as vozes de fantásticos convidados – como Romy e Oliver, os parceiros no crime em The XX – são insuficientes para descrever a mestria do resultado final. Há aqui algo mais, algo difícil de explicar, algo que nos faz sentir. Cinco anos foram necessários para produzir um álbum de estreia que já tem o destino traçado, o destino de ser uma autêntica ‘masterpiece’ para o artista britânico.
Chick to Chick | Da Chick
Demorou, mas chegou! Após alguns anos à espera do primeiro longa-duração de Da Chick, finalmente chega-nos Chick to Chick e o melhor mesmo é preparar-se para apanhar um comboio só de ida aos anos 70. Funk é a palavra de ordem no álbum de estreia da miúda do cocktail, num trabalho que conta com êxitos previamente lançados, mas que não os torna âncoras e dá espaço para novos temas brilharem. Um álbum que apesar de ter uma linha bem marcada, uma identidade, também consegue mostrar a versatilidade de Da Chick, facilmente comprovada com a irreverência de “Lotta Love”, a soul de “Don’t Touch My Soul” e até o lado mais sombrio de “Miss darkness”. No final, Da Chick não é mais que o melhor dos cocktails, um “Cocktail” único, com “muito soul, muito jazz, muito funk e muita classe!”.
Highway Moon | Best Youth
Highway Moon é transcendentemente belo. A doçura da voz de Catarina entrelaça-se com a rispidez de uma batida marcada, o analógico dá a mão ao digital, os sons retro encontram algo de contemporâneo. O resultado? Música de subtil sensualidade, trendy, mas com algo mais, algo difícil de explicar mas que nos atinge. Depois do já longínquo EP Winterlies, em 2011, o som dos Best Youth amadureceu, a componente electrónica evoluiu e acabamos com um álbum que ultrapassa barreiras, um álbum em que a simplicidade é um veículo para a nossa alma.
Days Gone By | Bob Moses
Bob Moses é a junção de dois mundos aparentemente distantes. É o deep electro com uma linha pop,. Se já houve aproximações entre estes dois mundos? Sem dúvida. É fácil pensar por exemplo em La Roux, The Ting Tings ou até em Disclosure, mas Bob Moses é algo mais, algo para além de um base pop com uns toques de electro lá encostados. Talvez aqui a abordagem seja inversa: uma base de deep electro com uns toques de pop. Perguntará o leitor se no fundo haverá alguma diferença. Há, muita. Aqui a componente electrónica tem vida própria, funciona por si só, sem ser preciso sequer a voz, sem ser preciso nenhum artefacto. A repetição não é tabu, as letras cheesys não são tabu, a junção dos dois é algo de extraordinário!
“Days Gone By” é o álbum de estreia onde não há medo de longas faixas nem de refrãos que ficam na cabeça. Aqui pode-se dançar, mas também se pode cantar. Este encontro do melhor de dois mundos é estranhamente eficaz, trazendo um álbum fortíssimo quando visto como um todo, mas em que cada faixa vale por si só, isolada como se de um single se tratasse.
Futuro Eu | David Fonseca
David Fonseca não vive no passado, não tem medo de inovar, não tem medo de arriscar, não tem medo de seguir o seu caminho criativo. Sem que nada o fizesse prever, o músico de Leiria lançou vários temas cantados em português que acabaram por culminar no seu último álbum – Futuro Eu. Muito forte, bem ao jeito daquele que é um dos maiores nomes da pop rock portuguesa, em Futuro Eu não faltam canções marcantes, capazes de nos trazer sorrisos nos por a cantar sem qualquer aviso. Aqui não falta a guitarra, as tão distintas teclas, a voz inconfundível e até há espaço para os coros catitas e umas palminhas em segundo plano.
Mas afinal será que David Fonseca mudou assim tanto? Talvez não. Talvez David continue a ser David, agora apenas a cantar – e bem – na sua língua mãe. A verdade é que as músicas de “Futuro Eu” gritam o David Fonseca de sempre, só que o gritam na língua de Camões. No final uma mudança tão gritante acaba por não abalar em nada a música de David Fonseca. É uma verdadeira lufada de ar fresco no trabalho do músico fundador dos Silence 4 mas sem lhe retirar pitada de identidade.
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