Azores Burning Summer: uma ode à liberdade de pés descalços


Abriu ontem o recinto ABS Park da segunda edição do Azores Burning Summer, depois de dois dias onde o festival se realizou exclusivamente no recinto montado na praia.

Devo dizer que fiquei surpreendido com o espaço que a organização preparou para receber os festivaleiros. A iluminação estrategicamente colocada deu outra vida ao parque de campismo do Porto Formoso. O palco foi transformado numa mini selva amazónica, todo cravejado de plantas, pequeno e acolhedor, perfeito para receber os estilos de música a que o festival se propõe.

A abrir as hostes, Matti e Sara Cruz. A última, presença já assídua nos festivais do arquipélago, presenteou-nos com a sua voz calma e doce, acompanhada, como sempre, da sua guitarra, abrindo caminho para os nomes de peso que se seguiam.

Temos um Adrian Sherwood que sobe ao palco, essa figura mítica do ‘dub’, e nos apresenta Carroll Thompson, a diva do ‘Lovers Rock’, um sub-género do reggae, que com a sua voz consegue fazer com que as pessoas, poucas e muito dispersas pelo enorme recinto, se cheguem ao palco. Ela canta e pede ainda mais proximidade, quer sentir calor humano, para condizer com a música que trouxe.

Pelo caminho, que passou um pouco por toda a sua carreira, houve lugar a uma interpretação de “Piece of my Heart” da eterna Janis Joplin, que finalmente rendeu os festivaleiros mais tímidos à cantora. Pena que, quando estava tudo já em sintonia, o concerto acabe. Pelo menos tivemos direito a uma hora de uma lenda, que disse amar-nos e amar esta terra de vulcões.

De sobretudo de cabedal castanho, Dennis Bovell sobe ao palco acompanhado do sempre omnipresente Sherwood, e dá o melhor concerto da noite. “Are you ready for some reggae”, pergunta. A resposta cá de baixo é um unânime sim.

Do topo dos seus 63 anos, dança, canta, grita, é DJ. São duas horas de pura energia e finalmente, os festivaleiros perdem toda a vergonha e dançam, de pés descalços, descomprometidos e felizes.

Adrian Sherwood sobe então novamente ao palco e dá o mote para terminar o concerto, Dennis Bovell parece não querer abandonar-nos, talvez por ele ficava mais duas horas, por nós também.

Só é pena mesmo que estas duas personagens incontornáveis do reggae, Thompson e Bovell, não se tenham feito acompanhar de uma banda, que certamente iria enriquecer o espetáculo. De qualquer das formas, não foi de todo necessário. A energia que transmitiram e o peso da história da música que carregam não precisam de mais artefactos.

De seguida é a vez de Evergreen tomar conta da mesa de som e dar-nos mais duas horas de ritmos reggae para o corpo, a noite já vai longa, mas ninguém parece cansado, ninguém olha para o relógio, ninguém para de dançar.

Por fim, e para terminar com chave de ouro uma noite já de si memorável, sobe ao palco Zé Pedro Moura, DJ da discoteca lisboeta Lux/Frágil que protagonizou um dos momentos da noite chamando ao palco dois jovens festivaleiros espanhóis para acompanharem a sua eletrónica com tambores. Mágico.

É de momentos de comunhão como estes, entre público e artistas que se cria a mística dos festivais e apesar do Azores Burning Summer ainda so ir na sua segunda vida, já vai no caminho certo para se tornar uma espécie de festival de culto.

Abandonamos o recinto, cansados, e só esperamos que hoje a festa seja tão boa ou melhor que ontem. De pés descalços, claro.

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