Música original açoriana em destaque no concurso Angra Sound Bay


O Angra Sound Bay é o concurso musical que, desde há dois anos, veio substituir o velhinho Angra Rock. Este, nasceu nos finais da década de 90 e passou por várias fases e espaços. A final foi-se deslocalizando para a Praça Velha, coração da cidade. O figurino do concurso mudou com o tempo, mas foi sempre para música original, o que, só por si, tem muito mérito e exige coragem. Ao longo das suas diversas edições, atuaram bandas sobretudo da Terceira, mas também de diversas ilhas, incluindo São Miguel e, ultimamente, também do Continente. Desde o início e por muito tempo, a este evento colaram-se alguns rótulos: de ser basicamente uma coisa para “miúdos”, da música original açoriana limitar-se a franjas marginais do rock e ainda a crença saloia de que a música original raramente é boa. Os prémios pecuniários nunca foram elevados, mas chegou a fazer parte da oferta uma atuação nas Sanjoaninas, o que não deixava de ser aliciante.

Desde o ano passado, o concurso vestiu-se de novas roupagens e foram introduzidas alterações importantes, resultado da parceria entre a AJITER (Associação Juvenil da Ilha Terceira) e a Câmara Municipal de Angra do Heroísmo. O nome mudou para Angra Sound Bay, exigindo-se quatro temas originais e o concurso passou a contar com duas audições, uma na Terceira e outra em Lisboa, possibilitando assim a participação de projetos sediados fora da Região e transformando-o num evento nacional. O cenário da final pode ter-se cristalizado na Praça Velha e no seu generoso palco principal, mas, se assim for, a data da final torna-se fundamental, devido à incerteza do nosso clima. Por isso, se é para ser depois do Verão, talvez o momento melhor seja mesmo pelo S. Martinho, que raramente falha. A noite de 8 de novembro passado estava magnífica e o público acorreu em número significativo, ao contrário do habitual. Foi uma noite muito agradável.

Em seguida, passo à análise da edição deste ano, somente da final, por limitações de espaço, pela ordem da apresentação.

JOÃO DA ILHA

Um músico talentoso e um valor seguro, em boa hora regressado às origens, com uma belíssima voz e uma produção própria muito interessante e com identidade, mas capaz de alternar entre ritmos diferentes.  Terá ainda muito para nos dar, ao longo da sua carreira. Foi um dos quatro finalistas apurados e ganhou o prémio da Melhor Composição Original, com um tema que considero excelente.

JOÃO FÉLIX

Sempre achei a produção musical do João Félix de grande qualidade e tive oportunidade de lhe dizer isso pessoalmente. Quanto aos temas que apresentou neste concurso, inscrevem-se todos dentro da mesma linha melódica, muito dolente e de marcada melancolia. A qualidade das composições e da execução é indiscutível e seria muito difícil não o selecionar para a final. Contudo, de um ponto de vista meramente pessoal, esta sonoridade específica não me seduz. Foi um dos quatro finalistas apurados.

SAMFADO

Trio formado por amigos e colegas universitários para este concurso, embora já tocassem ocasionalmente juntos. São eles, a Inês Bettencourt, terceirense, o Eduardo Abreu, madeirense e o Pedro Cotti, brasileiro de S. Paulo. Este último é o compositor e letrista do trio. Já conhecia dois dos temas compostos pelo Pedro e tinham-me ficado de imediato gravados na alma, pela grande qualidade de músicas e letras. A Inês, já conhecida na Terceira (musicais Mamma Mia e Gente em Branco, projeto Safira, etc), é dona de uma voz bonita e afinada, embora não devesse cantar sentada, por vários motivos. Com uma execução musical competente e suficiente, os quatro temas apresentados são todos de grande qualidade. É incrível pensar que pelo menos um destes temas foi composto em cima do joelho. O grupo pode vir a beneficiar no futuro do enriquecimento musical das composições, de maior acentuação no ritmo, do aperfeiçoamento vocal e da inclusão de um percussionista. Além disso, se quiserem sair do nível da apresentação intimista, terão, obrigatoriamente, de usar instrumentos com amplificação própria. O seu som era quase inaudível na Praça Velha, o que foi uma pena e os prejudicou. Foram apurados para a final a partir da 1.ª audição.

UZHOMS

Em qualquer show coletivo, não duvido que esta banda tenha de se apresentar em último lugar pois é inegável o clima de alegria e boa disposição que promovem. Garantem sempre um final em festa. À parte disso, são músicos com qualidade (mais no instrumental do que no vocal) e apresentam um pop-rock com temas que já vão sendo bem conhecidos como o seu impagável “John d’América”. As suas composições caraterizam-se por um rock alegre e bem marcado, em que está sempre presente um humor irresistível que perpassa por todos, mas se centra sobretudo na veia cómica do vocalista. Lembram-me bastante bandas icónicas e raras, como os saudosos Fúria do Açúcar. Quanto à qualidade musical dos temas apresentados, considero-a variável, mas sempre interessante e nunca pobre, embora se revista de um forte pendor local (sotaque, referências, etc). Foram um dos quatro finalistas selecionados e levaram o prémio do Melhor Projeto, o que me pareceu aceitável e justo.

foto 1 - Uzhoms - AJITER Andreia Rosa

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Crédito Foto: AJITER/Andreia Rosa

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