Viagem pelo mundo a partir de “Roma”


Embora dê nome ao novo disco de JP Simões, a cidade de Roma é apenas o ponto de partida para uma viagem nas asas deste “Português Voador”. O primeiro percurso – “La Strada” – é feito num ambiente leve e optimista, mas não se deixe enganar, a viagem está cheia de solavancos sentimentais.

Da esperança de poder “ver a ilha surgir no mar” à resignação e aceitação do destino (“vamos sempre navegar à toa, vamos sempre naufragar”), JP Simões canta os dilemas e os complexos ancestrais de todo um povo, sem esquecer o momento difícil por que passa o nosso País: “Tortura é viver sob o jugo dessa tua inteligência, depois de tanta estupidez, eis que tu chegas outra vez, com a fome, o frio e o medo. Hoje vens de computador, de Taliban, de Goldman Sachs, money, money, Milton Friedman”. As claras referências destes versos de “Rio-me de Janeiro” são um grito de revolta perante a actual situação económica e social e perante os responsáveis pela implementação de políticas económicas liberais, que são comparados a um “bicho cruel” que JP Simões manda para “a culpa que o pariu”.

Mas não é só o passado e o presente que preocupam o autor, é também o futuro, “pois muito em breve, cidadão, pagarás o ar que engoles e os passos que dás no chão”, porque “todo o mar e toda a terra têm dono, e até a lua não escapa no mapa das transacções”, avisa-nos num corrosivo humor negro e ao som da mais festiva Música Popular Brasileira em “Samba Radioactivo”.

“Gosto de me drogar”, que é single do disco, retoma as sonoridades da Bossa Nova cantada em português com sotaque europeu, registo em que a autenticidade de JP Simões mais se salienta, e onde a sua técnica da guitarra e timbre vocal inconfundível brilham de forma mais intensa. Este foi, aliás, o registo predominante no álbum “1970”. Como o próprio nome da música revela, este é um tema, do início ao fim, politicamente incorrecto, de alguém que não tem medo de dizer tudo o que pensa, sem filtros impostos pela sociedade.

Se dúvidas houvesse, “Roma” mostra que JP Simões é, não só um grande músico, compositor, e intérprete, mas também um excelente poeta. A palavra tem um papel fundamental no seu trabalho. Não há versos para “encher” nem palavras para “rimar”. Tudo faz sentido.

Musicalmente, “Roma” é mais eclético que os anteriores trabalhos de JP Simões: ouve-se Música Popular Brasileira, percussões africanas, sopros latinos, e sonoridades a fazer lembrar os tempos de Belle Chase Hotel. Cantado em quatro línguas – português com dois sotaques, italiano, inglês e francês – este álbum estará, certamente, entre os melhores portugueses de 2013.

 

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